Fitoterapia é uma saída para reduzir gastos no sistema público de saúde
Num país como o Brasil, onde a população carente não só tem dificuldades para obter os medicamentos convencionais mas também adoece muito mais, o uso criterioso da fitoterapia no sistema público de saúde pode ser uma alternativa para a redução do custo dos medicamentos.
Enquanto na região Sudeste os medicamentos convencionais ainda são os mais prescritos pelos médicos, estados como o Ceará e a Paraíba desenvolvem algumas iniciativas bem sucedidas de uso de medicamentos não-convencionais.
A experiência mais antiga é da Universidade Federal do Ceará (UFCE) que em 1983 começou a implantar o programa Farmácias Vivas, sob a coordenação do professor José Abreu Matos. Seguindo as recomendações da Organização Mundial de Saúde (OMS), o programa oferece assistência farmacêutica fitoterápica de base científica às comunidades mais carentes de Fortaleza, aproveitando as plantas de ocorrência local ou regional dotadas de atividade terapêutica comprovada.
Outra iniciativa é a da Secretaria de Saúde do Estado da Paraíba que a partir de 1998 começou a implantar o Programa de Alternativas Alimentares, Terapias Complementares, Homeopatia e Acunpuntura (PROACHA), sendo que a fitoterapia está contemplada dentro das terapias complementares.
Os médicos, de modo geral, aceitam bem a fitoterapia, mas não a prescrevem por falta de conhecimento técnico, fruto de uma educação deficiente nessa área, conforme mostrou uma consulta realizada pela Secretaria de Saúde. Para suprir essa demanda, as universidades Federal e Estadual da Paraíba já oferecem a disciplina de fitoterapia para alguns cursos da área de saúde.
Trabalho Interdisciplinar - Implantar a fitoterapia no sistema de saúde não é um trabalho fácil, pois envolve diversos profissionais, como médicos (para prescrever), farmacêuticos (para manipular) e agrônomos (para planejar o cultivo das plantas), entre outros. Além disso, é necessário conhecimento técnico sobre as plantas, seus efeitos terapêuticos e tóxicos, parte utilizável, via de administração e um bom banco de dados de referências bibliográficas. Tudo isso só é possível através da pesquisa contínua, desenvolvida dentro das universidades.
Tão importante quanto a pesquisa é a divulgação e o ensino da fitoterapia nos cursos de graduação da área de saúde, para que aos poucos vá se formando uma nova mentalidade, que proteja e ao mesmo tempo utilize o potencial da flora brasileira, colocando-o, de maneira mais acessível, à serviço da saúde.
Brasil tem 10 mil espécies de plantas medicinais e aromáticas
O Brasil abriga 55 mil espécies de plantas, aproximadamente um quarto de todas as espécies conhecidas. Destas, 10 mil podem ser medicinais, aromáticas e úteis. É o que aponta estudo realizado por Lauro Barata e Sérgio Queiroz, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), denominado Contribuição Efetiva ou Potencial do PADCT para o Aproveitamento Econômico Sustentável da Biodiversidade. Segundo os pesquisadores, o mercado mundial de produtos farmacêuticos, cosméticos e agroquímicos soma aproximadamente U$ 400 bilhões ao ano, o que dá a dimensão da enorme oportunidade existente para os produtos brasileiros.
Só no setor de medicamentos, de acordo com o pesquisador Luiz Carlos Marques, do Departamento de Farmácia e Farmacologia da Universidade Estadual de Maringá (UEM), o volume de vendas de fitoterápicos no mundo já atingiu a cifra de US$ 13,9 milhões ao ano. O valor representa cerca de 5% do total de vendas no mercado global de medicamentos.
O interesse pelos produtos naturais tem origem em fatores comportamentais, biológicos, farmacológicos, biotecnológicos e químicos, que produziram uma mudança na estratégia das empresas, que passaram visar ao mercado dos produtos originados de plantas. Segundo Barata e Queiroz, a literatura especializada tem mostrado que esta guinada em direção aos produtos naturais se inspira em grande medida nas florestas tropicais do Brasil, China e Índia. Esses países são considerados verdadeiros mananciais de moléculas bio-ativas.
O potencial da flora brasileira também é comprovado por Elisaldo Carlini, do Departamento de Psicofarmacologia da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp): "Tomemos como exemplo que nem todas as espécies tem fins terapêuticos. A Suíça, por exemplo, pode ter uma única espécie em sua vasta flora que atenda às finalidades terapêuticas; a Alemanha possui mais de 20 espécies; o Reino Unido, 100 espécies; o México, 3 mil e o Brasil mais de 25 mil plantas nativas. Isso somente na Amazônia, fora o Pantanal, o cerrado e a caatinga; cada região com sua flora característica e enorme potencial de investigação científica", diz.
Industrialização - Segundo Carlini, cientistas e laboratórios do exterior começam a perceber o potencial da fitoterapia e não somente para populações menos favorecidas. Para ele, a indústria brasileira está disposta a colaborar mas faltam incentivos à pesquisa no Brasil: "É necessário e urgente investir em pesquisa. Não adianta querer impedir uma corrida à nossa flora se nós não podemos competir. Precisamos nos preparar para essa corrida, só assim poderemos competir", declara.
As empresas brasileiras encontram-se em estágio de desenvolvimento suficiente para a fabricação de produtos farmacêuticos. "Embora com qualidade deficiente, a indústria brasileira já produz fitoterápicos", dizem Lauro Barata e Sérgio Queiroz. Os medicamentos vendidos em farmácias no Brasil, contendo produtos naturais, associados ou não, renderam aproximadamente U$ 470 milhões em 1994.
Mas o Brasil também exporta plantas medicinais para serem processadas no exterior, embora tenha tecnologia para fazer esta operação internamente. Dados do Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) apontam que o volume de plantas exportadas triplicou nos anos de 1993 a 1995.
A quantidade de medicamentos patenteados pela indústria farmacêutica brasileira é praticamente nula, se comparado com a indústria estrangeira. Uma das limitações está no fato de que 70% do mercado é controlado por empresas transnacionais. Apesar disso, as universidades já começam a desenvolver suas próprias patentes. Um exemplo é o do Departamento de Psicofarmacologia da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) que tem duas patentes desenvolvidas com a colaboração de indústrias brasileiras e está desenvolvendo parceria com aUniversidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), juntamente com um laboratório brasileiro, para um novo preparado fitoterápico.
Um grande problema da exploração da flora para formulação de medicamentos é o risco de extinção das espécies.
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